22/12/2007

Santíssima Trindade Bizarra

Mais que precisar matar o homem em seu Deus para adorá-lo, os cristãos transformaram a família em um bizarro triângulo sem mãe, substituída pela figura masculina ou assexuada do espírito santo. Diferente dos gregos pré-decadência, temos muita dificuldade em lidar com símbolos, por isso eles costumam ficar nas entrelinhas, e não é difícil associar a mulher à criação ou à Gaya Terra. Longe das voluptuosas Deusas-Terra dos pré-mesopotâmicos, essa mentalidade posteriormente cristã já começa a despontar antes de Platão, quando, no Édipo de Sófocles, a culpa lhe atinge como um valor supra-terreno, apesar de ele, a vox populi da época, sempre dizer-se inocente – o destino e o flagelo deixaram de ser arte para surfar na física sobre-natural.
Hoje, a vox populi já chama pelo sangue terreno da mãe cristã em Maria Madalena e os best sellers provam que estamos prontos para ele.

Maomé foi casado com uma mulher rica e mais velha, onde está a mulher no Islã? Já nos causa repulsa a repudia ao feminino.

Pelas entrelinhas, os velhos símbolos renascem.

20/12/2007

Paisagem

Era naquela fresta aberta pelo tempo
que transcorria o filete de vida do mundo de fora
pelo pouco de luz
vazando ao buraco
da janela velha,
já caduca.

E porque as duas coisas ocupavam o mesmo lugar,
entrelaçando em um só espaço,
naquela casa começava a rebentar o impossível.
Era a janela reta, imóvel, que
por ser velha,
não era mais janela,
era se desintegrando -
a ruína que o tempo traz.

E a casa ia se desmontando
enquanto o mundo vazava-lhe a janela –
há continente para o mundo que transborda
pelas frestas.

Na poeira suspensa,
o ar tensionava
como a expectativa de que tudo vai se assentar
à espera milimétrica da grande revolução.

Mas isso é só o velho desejo
de corte fino
que provoca,
te iludindo completamente,
o impulso de vida,
e te faz olhar o futuro
com os olhos de hoje,
e então,
tudo é agora.

15/12/2007

Mono e politeísmo

O politeísmo sempre esteve muito mais próximo da natureza do homem que o monoteísmo. Os Deuses são representações das diversas máscaras humanas: raiva, submissão, bonança, vingança, domínio. Já o monoteísmo é a representação simbólica e o instrumento ideológico da concentração de poder, do controle - os papas, os aiatolás, na falta de força terrena, precisam de uma farsa pictórica para justificá-los, como um espelho do outro mundo onde eles se reflitam, por isso no reflexo há só um e não uma multiplicidade. O politeísmo já pode ter servido às forças terrenas, mas nunca as pretendeu dominar e no mais das vezes são seitas múltiplas e esparsas como o candomblé e o hinduísmo, reflexo das multidões no imaginário metafísico.

O budismo é a exceção, há só um reflexo, mas o ideal é politeísta. Isso porque até o seu além serve para direcionar a vida para este mundo.

O fato de a semente do mundo já germinar na mente dos últimos séculos, só vai enfraquecer o monoteísmo, e o número crescente de islamitas é a contra-reação natural a retardar a inevitabilidade dessa gestação.

Os próximos séculos vão continuar a ver o esparsamento da religião até a sua desestruturação como instituição para ocupar o devido lugar na liberdade ou estupidez individual. Vamos adorar cada vez mais Deuses, mais fragmentários, até que eles se pulverizem nas singularidades de cada homem e, por fim, só restará Ele, o homem.

Encontra-se

Já deveria saber que nestas horas não há nada o que se dizer para si mesmo. Quando a noite revela as angústias acalentadas pela euforia do dia e aquela pessoa verdadeiramente escondida sob tantas se prostra pasma diante dos meus olhos de espelho. É neste instante que a solidão me esmurra contra a parede, sombreando a fome do mundo, os genocídios, a miséria –
onde estão?
Nem o desejo da arte e da carne me distraem de mim, e esse encontro é tão inebriante quanto o verão esmerilando em Sol a pino.

10/12/2007

Três Pensamentos Sobre a Lógica

1.

Aluno: o que é a lógica?

Professor: Se A é B e B é C, logo A é C. O resto são desdobramentos.

Aluno: Ora, se A é C, então por que A é A em primeiro lugar?


2.

A lógica é a preguiça do pensamento. Nela, tudo se resume a achar igualdades sob a lente da distância, mas quando chegamos bem perto do mundo, das coisas, nada é realmente igual, por isso é tão difícil entender os átomos e coisas menores: paradigmas inadequados. Platão era um preguiçoso para o mundo, preferia relaxar a mente no além, e o bocejo inicial fecundou no solo fértil da decadência grega e do monoteísmo metafísico medieval. Nietzsche dizia que achar igualdades talvez fosse uma vantagem evolucionária em nosso cérebro selvagem, hoje vejo que é pura preguiça sob o véu do rigor científico.

Veja: distância e proximidade são visões possíveis e, por vezes, contraditórias, mas atenção, já é hora de nos reaproximarmos das coisas – bem-vindo ao mundo!


3.

Quer fazer um avião voar? Use a gravitação de Newton.
Quer entender as estrelas? Use a gravidade relativa de Einstein.
Precisa de igualdades? Use a lógica
Precisa de diferenças? Uso qual ferramenta?

Awaking

As morning shines,
sun lies betwen times,
inside my eyes,
visions rise
in powder divisions.
Sleeping thoughts awake my body
in his endless night,
sleepering me into my life.

Desenlace

A noite invade as brechas do espírito
e vai arrancando as cascas bem devagar,
desbotando um prazer leviano.
Cinco mil lembranças vão emergir,
e só duas ou três vão marcar minha retina
a reluzir no amanhecer.

05/12/2007

Nobreza

Rir da nobreza é a seta que aponta seu declínio. Os bobos-da-corte tiveram seu auge já na decadência da idade média porque o riso mostra quão frágeis estão os valores que sustentam a classe. Rir é o descompasso entre o que percebemos e o que sentimos. Porém demorou 4 séculos até que de pequenas ascensões burguesas rebentasse Napoleão – o primeiro plebeu que se fez nobre – não sem uma violenta reação contrária. Hoje já é comum à plebe ascender à nobreza, meio milênio depois dos coringas. Mas lhes pergunto: já não estamos rindo da nossa nobreza?

Em um milênio, algum historiador olhará nossos jornais e televisão dando uma boa risada.