02/01/2008

Arte

A arte dos últimos séculos foi o artesanato da desconstrução. As epopéias saíram do mundo, de onde se viajava para dentro do homem, para vagar no próprio homem de onde ele vê o mundo. Ulisses virou Josef K, Édipo, Ródion e Quixote, Casmurro. Sem as bússolas, somente a insignificância de uma barata poderia penetrar nos subterrâneos do homem, e vivemos encolhidos, à espreita do mundo, dominados pelo pavor do movimento que nos faz correr para qualquer abrigo escuro e úmido.

O capítulo último dessa entronização é o desmantelamento da técnica, daquilo que construímos com base no mundo e para sua viagem por ele. Por isso não foi difícil de Renoir chegarmos a Pollock, de Kafka ao dadaísmo, não é à toa que a bagunça pictórica de Picasso e Miró caem como uma luva nos gostos populares. Todas as explicações metafísicas sobre essas artes podem descer pelo penico de Duchamp: sem Deus ou o Homem e seu mundo para guiar a arte, as tautologias pseudo-intelectuais se perdem no vazio que nos tornamos, rastejando pelas percepções sagazes de Kafka.

Arte é, sobretudo, sentir, experimentar. Se precisamos de explicações, se nos deleitamos com elas, a arte se perdeu em algum lugar entre as ciências e a teologia.

O que proponho para a arte? Não menos do que proponho para a humanidade – a técnica invisível. Já deu tempo suficiente para perceber que ausência de técnica é escravidão aos limites e não liberdade. Técnica é meio, e não fim, para a viagem pelo mundo que construímos - o mundo de arte - de onde brota o mundo de nossos pés. Pelas periferias, ilustradores já reintroduzem a técnica daquilo que, no futuro, os “intelectuais” tardiamente chamarão de arte.

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