02/01/2008

Miséria e Compaixão

Quando se vê um miserável em sofrimento, e sofre-se junto com ele a dor da miséria, o que sentimos? Nada de bom, deprimimo-nos. Essa é a compaixão. Querê-lo longe da pobreza, em bonança e excesso, é o que faz quem quer homens fortes como amigos, vizinhos e até inimigos, e o faz menos por altruísmo que por individualismo. Ter vizinhos pobres é sinônimo de problema, de um espírito covarde incapaz de lutar com inimigos a altura, de alguém que não produz nada que possa engrandecer a vida de quem não seja miserável. Os europeus, depois de duas guerras, bem sabem disso e trataram de tirar Portugal da mendicância. Em países favelizados como o Brasil, ainda não aprendemos essa lição.

Mas a compaixão não tem nada a ver com essa força que eleva o espírito do homem e do seu coletivo, ela é antes o eufemismo de rir da desgraça alheia travestido de sofisticada superioridade de sentimentos. É isso que vemos em filmes “alternativos” sobre a pobreza, caridades sociais - alguém acha que meia dúzia de alimentos vai mudar a realidade da miséria?

O grande homem cria meios para conviver com pares, o compaixonado, mesmo sem o saber, cria os meios de perpetuar a miséria, e o faz para sentir-se bem, expurgando a culpa da riqueza material na percepção de que seus sofrimentos privados são mínimos frente aos da miséria. O grande homem sabe que não há culpa a sentir-se nem compaixão com o sofrimento alheio, o que há são meios concretos para eliminar a miséria do convívio em sociedade.

O compaixonado dá o peixe, escravizando o esfomeado, o homem superior ensina a pescar.

Sempre se acreditou que onde há miséria, brota a compaixão e a solidariedade no homem. Eu inverto essa oração!

Bem dizia Nietzsche: a pior coisa são os mendigos. E como é difícil não sentir compaixão por eles. Talvez por isso ainda tenhamos tantos.

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